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O RESGATE- PARTE 5

De volta a segunda-feira, dia o qual me sinto segura por sua rotina chata e estável, encaro minha realidade, enterrando toda a loucura do final de semana no quintal dos fundos.
Trabalho em um banco privado há alguns meses, é tão monótono e sem graça como a minha vida. Perfeito para mim!
Penso mil vezes antes de entrar na academia e encarar Antonio. Respiro fundo e me desafio a entrar. Entro cabisbaixa, quase imperceptível aos olhos dos outros. Menos os  de Antonio que  me fitam com ar de desapontamento.
Sinto um embrulho no estomago, envergonhada, descartável, sensações rotineira pra mim. Todos pegam seus pares e um garoto que sempre dança com a namorada, está sozinho. Antonio friamente me indica para acompanha-lo!
Que grande merda esta aula. Estou péssima. Gosto tanto daquele homem.
Procurando a chave do carro dentro da imensa bolsa, no meio do estacionamento sou surpreendida por Antonio.
-Anne, não acha que precisamos conversar?
- Desculpe, estou atrasada! – dou de ombros e saio em direção ao meu carro.- Ah não é assim não garota! Pode parando ai! – imobilizou-me em seus braços com força.
- Antonio, me solta! Não quero conversar, não quero nem fazer aula mais! Já chega! – gritei em um ato de desespero. – Calma Anne!! O que foi que eu fiz de errado?
- Não é com você querido! Eu adoro você, de todo o meu coração, sou eu, sou eu, sou eu...! – desabei em prantos em seu peito.
Acabamos no meu apartamento novamente, entrelaçados, sem perguntas, sem respostas. Só o desejo impar de ficar junto e não largar mais.
Assim se sucedeu nos dias seguintes, retomamos nossa “relação”. De dia banco, a noite dança e de madrugada amor. Antonio já não dormia mais em sua casa. Ele era tão meu e eu fui me permitindo ser dele. Sem explicações, sem raízes.
Ao fim da semana, um convite quase irrecusável.
- Anne, me acompanha no casamento da minha irmã neste final de semana? Será no interior, poderíamos aproveitar e passar o final de semana juntos! – pediu-me sorridente.
Como recusar um convite vindo daquela boca linda? Mas me questionei o que estávamos vivendo. Aquilo era um namoro? Eu não podia namorar. Não mesmo.
Sexta-feira, malas prontas, fugimos da aula e partimos para a estrada. Tínhamos uma sintonia de outro mundo. Barrabás estava no banco de trás e me sentia completa. Ao som de Janis Joplin e cabeças dançantes, o que mais temia aconteceu:
- Anne, qual seu segredo? – perguntou-me carinhosamente.
Eu perdi a cor, o rumo, a prosa, o rebolado, a consciência.
- Todo mundo tem seus segredos querido! Na hora certa, revelarei os meus a ti! Mas tudo no seu tempo, por favor...! – desconversei.
Seguimos viagem em clima de lua de mel.


To be Continued...

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Os queridinhos.

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