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Vencida por um sorriso- Final.

Depois de mais alguns drinques, olhares e passos já cambaleados, propus a ele que fossemos embora. Estava disposta a viver aquela noite com ele.
No carro, já rolavam caricias, mãos entrelaçadas e provocações mais explicitas, sugeri que ficássemos juntos– sim, a iniciativa bem resolvida e cheias de riscos foi minha- e ele topou de prontidão.
Fomos para casa dele e por um momento me senti tão parte daquilo tudo, como se em algumas horas ele já fosse meu e não tinha a menor intenção de devolve-lo a quem quiser que fosse.
Sentei-me no braço do sofá, ele se atirou ao meu lado. Sentia nele uma agonia tão latente, que me angustiava por tabela.
Iniciei em silencio uma massagem em seus ombros, cantarolando baixo uma cantiga em seu ouvido. Senti seus músculos aliviando aos poucos e seu semblante suavizando lentamente. Em um determinado ponto, ele me puxou para seu colo e finalmente me beijou com paixão.
Começamos a nos despir com uma pressa sem sentido, no meio da loucura, quando finalmente caímos na cama, o sorriso  se transformou em lágrimas e desabou:
-Não consigo, me desculpe, não dá!
Levei um susto e já me recompus; sentei-me ao seu lado e perguntei o que estava acontecendo.
Sorriso começou a contar uma história, que seria ali, um dos maiores desafios da minha vida.
Me contou que estava com um tumor e que tinha medo de iniciar o tratamento, estava no dilema entre lutar ou simplesmente aceitar seu destino. Falou dos sonhos que havia interrompido pela falta de expectativa e do seu medo de se envolver com alguém.
Abracei-o bem forte e disse, que de alguma maneira, estaria com ele, o tempo, a circunstância e a condição que fosse.

Adormecemos.


Vital, V.

Comentários

Os queridinhos.

Eu precisava ter...

Eu precisava ter sido a última a ser escolhida para a festa junina durante toda a minha infância. Eu precisava ter tropeçado na quadra durante a educação física no último ano do Fundamental e feito todos os garotos darem risada. Eu precisava ter presenciado cenas de agressão física e moral dentro da minha casa. Eu precisava ter visto minha mãe chorar durante noites a beira da minha cama. Eu precisava ter deixado uma mala pronta no armário ao longo dos anos, caso precisasse fugir repentinamente. Eu precisava ter ouvido que eu não podia ir à casa da Vanessa, pois a mãe dela não aceitava colegas com pais separados. Eu precisava ter sido excluída da lista da festa de debutante da Dai pois não atendia ao padrão estético das outras meninas. Eu precisava ter me sentido a pior das garotas. Eu precisava ter enfiado o dedo na gargant a diversas vezes, pois tinha ódio do meu corpo e vergonha de mim. Eu precisava ter me submetido a relacionamentos abusivos por não me sentir dign

Eu chorei pelo sistema.

Uma tarde fria de um domingo qualquer. Tudo acontecia lá fora como sempre aconteceu. As horas passavam, as pessoas grassavam gozando do seu direito de ir e vir, a fome assentava, o medo imperava, a angústia antecedente a segunda adentrava, enfim... Só mais um dia “normal”. E eu chorei.     Não no sentido poético, não de forma alegórica. [ Foi literal, foi visceral] Venho chorando desde então   - dia após dia -   de forma lancinante e,  desculpem-me a sinceridade, mas um tanto quanto colérica. Eu já chorei com Homero, Virgílio e Cervantes. Também com Drummond, com Flaubert e Assis. Hoje eu choro com Coetzee, Trotsky, Amendola, Bakunin e Marx. {Choro as lágrimas de Brecht.} Choro o sangue de Spies ,Parsons, Fischer e Engel.   Choro  ainda mais pelo João, pelo Zé, pelo Sr. Pedro, pela Dona Maria, pela Luisa, pelo Oswaldo, pelo (...) . Choro pelos meus filhos – pobrezinhos - que nem gerados foram e já estão condenados a exploração. Choro pela injustiça masca

E de repente passa...

E de repente passa... A dor que esmagava o peito, tirava o ar, embrulhava o estômago, passa... A saudade que mastigava, que corroía, que desbaratinava  simplesmente passa... O medo que cegava, que infiltrava, que assombrava... Passa também! E tudo aquilo que achávamos que nos mataria, vai se esvaindo, assim, como um copo trincado que perde lentamente a água e quando nos damos conta, já está vazio. Eu me esvaziei de você e nem me dei conta. Quando lembrei de ter saudades, eu já não a tinha mais. Deve ter pulado para outro coração. A tristeza já não mora mais aqui e eu não sei de seu paradeiro. Espero que ninguém encontre. E você, que era meu tudo, simplesmente não é  mais nada. Nada além de um vazio gigante que ficou no lugar de sua partida. Não dói, não fere, nada. Só é estranho, esquisito não ter você aqui me tirando o sono. Essa paz ensurdecedora é nova, preciso me adaptar a ela, afinal, por longo período, a única coisa que conhecia de cabo a rabo era o mal que me fa