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Encantamento

Os olhos dele brilhavam diferente dentre todos os olhos. Emanava uma energia que me arrepiava e um magnetismo que me roubava de todos ali.
Era um lugar comum, com pessoas comuns, com música comum; e por Deus, ele era tão especial! Não foi necessário trocar uma palavra pra perceber que ali, eu corria sérios perigos. Ele era ímpar. E eu queria ser seu par.
Bastou alguns passos  estávamos frente a frente, no ponto para devorá-lo. Mas ele era bom demais para isso, quis saboreá-lo aos poucos, gradativamente, para nunca acabar!
A cada palavra que saia de sua boca, me perfurava o estomago, causando um encantamento nunca vivido outrora. Todos os seus pontos de vistas eram diferentes e melhores do que conhecia.
Ele era jazz, era blues, era cor, era show, era bossa, era rock, era roll, era groove, era sexy, era ele. Ele era uma mistura das coisas mais incríveis que existiam.
Decorei cada centímetro do seu rosto, a curva acentuada que marcava seu sorriso – o mais lindo do mundo, juro!- a sobrancelha que acompanhava piamente as emoções transbordadas, o queixo simetricamente quadrado o que dava um toque de seriedade... E os olhos? Ah os olhos, tinham estrelas ao invés de pupilas. Ele segurava o copo de forma firme. Confesso, achava tudo nele bonito.
Ele tinha um cheiro de canela inebriante, e tenho a impressão de ser da própria pele dourada que recobria aquele ser surreal.
Olhava-me bem no fundo dos olhos, como se quisesse me desbravar, me desvendar. Era esse interesse dele em mim que o fazia mais curioso e excitantemente instigante; porque eu?
Isso nós ainda vamos descobrir, mas eu sei, por A mais B o porque ele.

Gradativamente, para não acabar.


Vital.V.

Comentários

Os queridinhos.

Eu precisava ter...

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Eu chorei pelo sistema.

Uma tarde fria de um domingo qualquer. Tudo acontecia lá fora como sempre aconteceu. As horas passavam, as pessoas grassavam gozando do seu direito de ir e vir, a fome assentava, o medo imperava, a angústia antecedente a segunda adentrava, enfim... Só mais um dia “normal”. E eu chorei.     Não no sentido poético, não de forma alegórica. [ Foi literal, foi visceral] Venho chorando desde então   - dia após dia -   de forma lancinante e,  desculpem-me a sinceridade, mas um tanto quanto colérica. Eu já chorei com Homero, Virgílio e Cervantes. Também com Drummond, com Flaubert e Assis. Hoje eu choro com Coetzee, Trotsky, Amendola, Bakunin e Marx. {Choro as lágrimas de Brecht.} Choro o sangue de Spies ,Parsons, Fischer e Engel.   Choro  ainda mais pelo João, pelo Zé, pelo Sr. Pedro, pela Dona Maria, pela Luisa, pelo Oswaldo, pelo (...) . Choro pelos meus filhos – pobrezinhos - que nem gerados foram e já estão condenados a exploração. Choro pela injustiça masca

E de repente passa...

E de repente passa... A dor que esmagava o peito, tirava o ar, embrulhava o estômago, passa... A saudade que mastigava, que corroía, que desbaratinava  simplesmente passa... O medo que cegava, que infiltrava, que assombrava... Passa também! E tudo aquilo que achávamos que nos mataria, vai se esvaindo, assim, como um copo trincado que perde lentamente a água e quando nos damos conta, já está vazio. Eu me esvaziei de você e nem me dei conta. Quando lembrei de ter saudades, eu já não a tinha mais. Deve ter pulado para outro coração. A tristeza já não mora mais aqui e eu não sei de seu paradeiro. Espero que ninguém encontre. E você, que era meu tudo, simplesmente não é  mais nada. Nada além de um vazio gigante que ficou no lugar de sua partida. Não dói, não fere, nada. Só é estranho, esquisito não ter você aqui me tirando o sono. Essa paz ensurdecedora é nova, preciso me adaptar a ela, afinal, por longo período, a única coisa que conhecia de cabo a rabo era o mal que me fa