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Foi quando...

Foi em meio a uma crise de choro sem ninguém por perto, após enxugar o rio de lágrimas que desaguavam sob meu rosto, que eu entendi o meu papel na minha vida.

Foi quando tive de me acalmar em meio a uma crise de ansiedade, que eu entendi a minha importância na minha vida.

Foi quando tive medo do barulho estranho vindo do outro cómodo e mesmo assim me levantei no escuro para ver o que era, que eu entendi minha coragem na minha vida.

Foi quando quebraram meu coração em mil pedaços e viraram as costas, que entendi que as pessoas não se importam de fato.

Foi recolhendo cada caco, me cortando, me doendo, espalhando e sangrando, que entendi que só sobra a gente mesmo.

Foi levantando, me reerguendo, tropeçando, aprendendo, cambaleando, que entendi que sou dona dos meus próprios passos.

Foi quando minha coluna travou e eu não tinha quem pegasse um remédio para mim, que eu entendi que era unicamente responsável pelo meu todo.

Foi quando as pessoas partiram levando consigo partes de mim, que entendi que não deveria me despedaçar por ninguém.

Foi quando sentei e chorei na calçada depois de passar mal no vestibular e as pessoas pularam o meu corpo como se eu não estivesse ali, que entendi como esse sistema funciona.

Foi silenciando minha mente, que escutei minha voz.

Foi correndo o mais rápido que pude que percebi que o destino é a morte.

Foi num ato de desamor e desrespeito ao meu afeto mais genuíno que percebi o que eu não queria mais pra mim.

Foi tentando te encontrar, que eu me perdi.

Foi quando a solidão me invadiu, tomando forma e cor, que me vi livre de expectativas.

E foi quando não sobrou nada, absolutamente nada, que eu pude contemplar o tudo.

Tudo aquilo que habita  em mim.



Vital, V.

Comentários

Os queridinhos.

Eu precisava ter...

Eu precisava ter sido a última a ser escolhida para a festa junina durante toda a minha infância. Eu precisava ter tropeçado na quadra durante a educação física no último ano do Fundamental e feito todos os garotos darem risada. Eu precisava ter presenciado cenas de agressão física e moral dentro da minha casa. Eu precisava ter visto minha mãe chorar durante noites a beira da minha cama. Eu precisava ter deixado uma mala pronta no armário ao longo dos anos, caso precisasse fugir repentinamente. Eu precisava ter ouvido que eu não podia ir à casa da Vanessa, pois a mãe dela não aceitava colegas com pais separados. Eu precisava ter sido excluída da lista da festa de debutante da Dai pois não atendia ao padrão estético das outras meninas. Eu precisava ter me sentido a pior das garotas. Eu precisava ter enfiado o dedo na gargant a diversas vezes, pois tinha ódio do meu corpo e vergonha de mim. Eu precisava ter me submetido a relacionamentos abusivos por não me sentir dign

Eu chorei pelo sistema.

Uma tarde fria de um domingo qualquer. Tudo acontecia lá fora como sempre aconteceu. As horas passavam, as pessoas grassavam gozando do seu direito de ir e vir, a fome assentava, o medo imperava, a angústia antecedente a segunda adentrava, enfim... Só mais um dia “normal”. E eu chorei.     Não no sentido poético, não de forma alegórica. [ Foi literal, foi visceral] Venho chorando desde então   - dia após dia -   de forma lancinante e,  desculpem-me a sinceridade, mas um tanto quanto colérica. Eu já chorei com Homero, Virgílio e Cervantes. Também com Drummond, com Flaubert e Assis. Hoje eu choro com Coetzee, Trotsky, Amendola, Bakunin e Marx. {Choro as lágrimas de Brecht.} Choro o sangue de Spies ,Parsons, Fischer e Engel.   Choro  ainda mais pelo João, pelo Zé, pelo Sr. Pedro, pela Dona Maria, pela Luisa, pelo Oswaldo, pelo (...) . Choro pelos meus filhos – pobrezinhos - que nem gerados foram e já estão condenados a exploração. Choro pela injustiça masca

E de repente passa...

E de repente passa... A dor que esmagava o peito, tirava o ar, embrulhava o estômago, passa... A saudade que mastigava, que corroía, que desbaratinava  simplesmente passa... O medo que cegava, que infiltrava, que assombrava... Passa também! E tudo aquilo que achávamos que nos mataria, vai se esvaindo, assim, como um copo trincado que perde lentamente a água e quando nos damos conta, já está vazio. Eu me esvaziei de você e nem me dei conta. Quando lembrei de ter saudades, eu já não a tinha mais. Deve ter pulado para outro coração. A tristeza já não mora mais aqui e eu não sei de seu paradeiro. Espero que ninguém encontre. E você, que era meu tudo, simplesmente não é  mais nada. Nada além de um vazio gigante que ficou no lugar de sua partida. Não dói, não fere, nada. Só é estranho, esquisito não ter você aqui me tirando o sono. Essa paz ensurdecedora é nova, preciso me adaptar a ela, afinal, por longo período, a única coisa que conhecia de cabo a rabo era o mal que me fa