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que nem mocinha.

Tira a mão daí. Cacá. Sujo. Feia.

Senta que nem mocinha. Fechas as pernas.

                                      [ os olhos, a mente e principalmente a boca.]
Olha a postura.  
                                   Encolhe a barriga.
Anda direito.
                                                    Controla a emoção.
 Engole esse choro.
                                  Não come esse pão.

Não reclama.

Você não é qualquer uma. Quer acabar que nem ela?
Nem pensar, não tem idade pra isso.
Não acha que já passou da idade?
Está chegando na idade de...
Veja fulana, repare em sicrana.
Olha pra você.

O l h a p a r a v o c ê.

Mesmo?

Ou olha pra quem querem que seja?

Olha para fora, jamais para dentro.
Não ouse...
Abusada!
                                                   [ estou sendo, não aguento...]

Isso não é papel de mulher.
Como quer que ele te queira?
                                                   [ não quero... ]

Como quer que ele te respeite?
                                                    [ não é uma opção, ele vai ter que...]

Bate três vezes na madeira, deus ( qual?) a livre de morrer solteira.

                                                     [ ou é isso ou é morte na fogueira?]

Não de vazão.
                                                     [ e meu coração?]

Se preserve, não se exponha.
                                                    [ quem determinou a minha honra?]

Ai, ai, ai... Mocinha não fala palavrão.

                                         [também não pensa, não luta e nem sente tesão.]

Vende-se: discreta, casta e prendada.

                                        Não!!! Devolva-me.

Decidi ser:

              Livre
                                 Inteira                                         Autêntica
Safada
                                         Estudada
                                                                    Porrada
         Licenciosa
                                       Petulante                                Gritante
Voluptuosa



Menina, cale-se! Assim não vai ser ninguém (...)

Muitíssimo obrigada meu bem, mas esse alguém que querem que eu seja não me convém.

Digo tudo o que penso e o seu padrão não tem  meu “amém”.
Das cobranças enfadas e opressões que nos pungem, já não seremos reféns.






Vital,V.



Comentários

Os queridinhos.

Eu precisava ter...

Eu precisava ter sido a última a ser escolhida para a festa junina durante toda a minha infância. Eu precisava ter tropeçado na quadra durante a educação física no último ano do Fundamental e feito todos os garotos darem risada. Eu precisava ter presenciado cenas de agressão física e moral dentro da minha casa. Eu precisava ter visto minha mãe chorar durante noites a beira da minha cama. Eu precisava ter deixado uma mala pronta no armário ao longo dos anos, caso precisasse fugir repentinamente. Eu precisava ter ouvido que eu não podia ir à casa da Vanessa, pois a mãe dela não aceitava colegas com pais separados. Eu precisava ter sido excluída da lista da festa de debutante da Dai pois não atendia ao padrão estético das outras meninas. Eu precisava ter me sentido a pior das garotas. Eu precisava ter enfiado o dedo na gargant a diversas vezes, pois tinha ódio do meu corpo e vergonha de mim. Eu precisava ter me submetido a relacionamentos abusivos por não me sentir dign

Eu chorei pelo sistema.

Uma tarde fria de um domingo qualquer. Tudo acontecia lá fora como sempre aconteceu. As horas passavam, as pessoas grassavam gozando do seu direito de ir e vir, a fome assentava, o medo imperava, a angústia antecedente a segunda adentrava, enfim... Só mais um dia “normal”. E eu chorei.     Não no sentido poético, não de forma alegórica. [ Foi literal, foi visceral] Venho chorando desde então   - dia após dia -   de forma lancinante e,  desculpem-me a sinceridade, mas um tanto quanto colérica. Eu já chorei com Homero, Virgílio e Cervantes. Também com Drummond, com Flaubert e Assis. Hoje eu choro com Coetzee, Trotsky, Amendola, Bakunin e Marx. {Choro as lágrimas de Brecht.} Choro o sangue de Spies ,Parsons, Fischer e Engel.   Choro  ainda mais pelo João, pelo Zé, pelo Sr. Pedro, pela Dona Maria, pela Luisa, pelo Oswaldo, pelo (...) . Choro pelos meus filhos – pobrezinhos - que nem gerados foram e já estão condenados a exploração. Choro pela injustiça masca

E de repente passa...

E de repente passa... A dor que esmagava o peito, tirava o ar, embrulhava o estômago, passa... A saudade que mastigava, que corroía, que desbaratinava  simplesmente passa... O medo que cegava, que infiltrava, que assombrava... Passa também! E tudo aquilo que achávamos que nos mataria, vai se esvaindo, assim, como um copo trincado que perde lentamente a água e quando nos damos conta, já está vazio. Eu me esvaziei de você e nem me dei conta. Quando lembrei de ter saudades, eu já não a tinha mais. Deve ter pulado para outro coração. A tristeza já não mora mais aqui e eu não sei de seu paradeiro. Espero que ninguém encontre. E você, que era meu tudo, simplesmente não é  mais nada. Nada além de um vazio gigante que ficou no lugar de sua partida. Não dói, não fere, nada. Só é estranho, esquisito não ter você aqui me tirando o sono. Essa paz ensurdecedora é nova, preciso me adaptar a ela, afinal, por longo período, a única coisa que conhecia de cabo a rabo era o mal que me fa